sexta-feira, 1 de junho de 2012

Impressões Digitais de um estranho País (cont.)

207 -Continuamos a ler o manuscrito que Alice nos trouxe do snr. Tempo: Junto às portas das cidades há um sonho De achar o tétrico e o mágico e o novo Beber a pressa num copo de medronho E ver enxamear as ruas por todo um povo. Junto às portas das cidades há um grito Que vem do fundo da alma da aldeia abandonada E em cada largo nou avenida vemos um proscrito Que sobrevive na bolha de uma bússola avariada. Junto às portas das cidades há um gesto De acordar nas vielas a alma dissecada Dos que no sonho nada mais houveram que o indigesto Trapaceiro bruxo da vida naufragada. Junto às portas das cidades há um receio De tudo se perder no ventre citadino Pelo negócio que trabalha o paleio Com que um homem deixa de ser menino. Junto às portas das cidades há um canto que quer acordar as ruas e vislumbrar Todo um tempo de secar um pranto E ver as leis que o Povo quer saudar. Não me tragas trapos de ouvir o chão Não me queimes terras de perder a alma Toda a terra é pouca para o nosso pão Se a ganância gritar e perder a calma. Corpos de linho encharcados de mosto Cruzam as ruas de revolta em punho Cada vez menor é a guarida do Sol posto E o que é preciso não passa de rascunho. Restritos são os cavalos à desfilada Neste País incendiado por mais deserto Falta-nos o levantar sério da madrugada E acreditar que o Sol já lhe é tão perto. Nem rosas nem cravos nem mais flores Nas mãos que naufragam nas veias De um tempo em que a vingança dos senhores Já não tem o encanto das sereias. Talvez que a dor da terra dorida Se transforme em seara de vida.Não me tragas sonhos de mel desavindo Nem calçadas imperfeitas de mãos portuguesas Traz-me um pouco de puro mel florindo Em fatias de pão de improváveis mesas. Há um cão solitário em cada um de nós Que corre e percorre um mundo às avessas Sem que tanta vez faça ouvir a voz Olhando apenas o silêncio das travessas. Pela morte não queremos sequer incomodar Qualquer que seja das veneráveis excelências Cão solitário acaba por se acomodar Em qualquer das nuas e rudes saliências. O que se deixa por rastro é testamento Que apenas os mais atentos podem sorver Esquiços de um profundo pensamento Que a tudo resistiu para o futuro conceber. O incómodo apenas surge de se viver No fio de tudo o que pode rasgar A mansidão de um ignorante viver Que teimou com o tempo tudo resignar.Não tenho pressa em saber a caligrafia Do futuro que os senhores de agora nos querem dar. Num envelope meto a noite e o dia Para remeter a quem os queira clarear. Não posso assinar cada aplauso Que esta gente ao Mundo tenta arrancar. Não quero sequer sorrir. Apenas causo Tremores na consciência que ouso denunciar. Das artrites das ruas aos espirros dos bares Modela-se todo um tempo de asnear. Curiosamente os burros andam aos pares Mas já perderam o hábito de coicear. Já nada nos diz da velha bravura Que amotinava a arraia miúda. E a dor sem glória é a gravura Que fica na História de gente meã e graúda.Meu amigo. Meus amigos Falarei do pequeno conhecimento: Amai a pequena gota de água Que nos eleva acima da mágoa E tudo pode vivificar. Em cada semente há que amar O futuro que vai florir. Não respeitará o que queremos Apenas será o que desejamos. Não saberá discernir Entre o que fabriquemos E tudo aquilo que adiamos Mas será indelevelmente O futuro que teremos pela frente.

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